A razão pela qual não discernimos as coisas de forma clara é que nos detemos nas aparências exteriores, às quais logo associamos sentimentos de amor ou de ódio que bloqueiam nosso entendimento, impedindo-nos de vê-las como realmente são.
Para não caíres nesse engano, conserva sempre a vontade purificada e livre de qualquer afeto desordenado. Considera com discernimento e maturidade qualquer coisa que se apresente à rejeição (se for algo contrário às inclinações naturais), ou que o amor produza apegos indevidos (caso se trata de algo agradável).
Assim, livre das paixões, o intelecto pode conhecer com clareza a verdade, perceber o mal oculto sob uma falsa aparência de prazer e o bem encoberto por uma aparência de mal.
Mas, se a vontade se inclina primeiro a amar ou a odiar as coisas, o intelecto não pode conhecê-las bem, porque as paixões se interpõem e o ofuscam, fazendo-o estimá-las de forma errada, e representá-las dessa forma à vontade, que então se move ainda mais ardentemente a amar ou a odiar as coisas, sem qualquer consideração das leis da razão e da ordem.
Por causa das paixões o intelecto fica cada vez mais obscurecido, e essa obscuridade alimenta o engano da vontade em seus amores e ódios, de tal forma que, se não for observada a regra que vou te dar, essas duas faculdades humanas tão nobres, a inteligência e a vontade, irão tropeçar e cair miseravelmente em trevas cada vez mais profundas e em erros cada vez maiores.
Portanto, minha filha, guarda-te cuidadosamente de todo afeto exagerado por qualquer coisa que não tenha sido primeiro examinada e reconhecida pelo que realmente é, à luz da Graça, pela oração, e conforme o parecer do diretor espiritual.
Isso dever ser observado de forma especial na prática de algumas obras exteriores, que são boas e santas, mas que, por isso mesmo, acarretam para nós um risco maior de engano ou de indiscrição. Pois pode acontecer que, por alguma circunstância de tempo, de lugar ou de medida, a prática dessas obras santas e louváveis resulte em grande dano, como se sabe de muitos casos.
Retirado do livro “O Combate Espiritual”, de Lorenzo Scupoli
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