domingo, 10 de novembro de 2013

RELIGIOSIDADE Fiéis participam da Caminhada da Seca

Senador Pompeu. Na madrugada deste segundo domingo de novembro, antes da alvorada, milhares de sertanejos se concentrarão diante da igreja de Nossa Senhora das Dores, no Centro deste município, para participarem da 31ª Caminhada da Seca, uma marcha religiosa, social, cultural e histórica em sufrágio das vítimas da seca.


A marcha já está em sua 31ª edição e tem caráter religioso, social, cultural e histórico, em sufrágio das vítimas da seca ocorrida em 1932 FOTO: ALEX PIMENTEL

O tema deste ano é "Caminhada ao Campo Santo do Sertão, com fé, em busca do conviver e bem viver no Semiárido". Aproximadamente cinco mil pessoas participarão do cortejo, conforme estimativa dos organizadores. A paróquia conta com o apoio do Centro de Defesa de Direitos Humanos Antônio Conselheiro e do Instituto Casarão.

Este ano, durante a caminhada, haverá homenagem especial ao padre Albino Donatti, idealizador do evento, e à Luzia Ló, sobrevivente do campo de concentração da cidade. Ambos faleceram há poucos meses.

A romaria é de aproximadamente 6Km. Sai da Igreja Matriz ao cemitério da barragem do Açude Patu, onde foram sepultadas centenas de flagelados da seca de 1932. No local é possível ouvir ainda os tradicionais relatos dos sobreviventes daquela época. O pároco João Melo dos Reis estará à frente da marcha pelo segundo ano consecutivo.

Enquanto a paróquia de Nossa Senhora das Dores conclama os fiéis a participarem da procissão e rezarem pelas almas da barragem, o Centro de Defesa de Direitos Humanos Antônio Conselheiro e o Instituto Casarão articulam os movimentos sociais a levarem sua indignação ao martírio registrado no Campo de Concentração do Açude Patu.

Movimentação

Além do momento religioso, com missa campal e visita ao cemitério, o momento também é de luta, por conquistas sociais. Também organizam a logística de assistência ao público. Afinal, os fiéis caminharão debaixo do sol por mais de uma hora. Muitos terão sede, alguns precisarão até de assistência médica.

Conforme a assessora pedagógica do Centro Antônio Conselheiro, Marta Sousa, além das homenagens, este ano a Caminhada se concentrará na sua retrospectiva histórica, já que se passaram 30 anos da mobilização, criada pelo padre Albino.

Este ano, antecedendo o grande momento da programação, está sendo realizado em Senador Pompeu o Fórum Cearense Pela Vida no Semiárido, promovido pela Articulação do Semiárido (ASA).

"A construção da barragem do Patu trouxe como benefício o armazenamento de água, mas não existe produção a partir dela, e as famílias de moradores do seu entorno não têm benefício algum. O Fórum será encerrado na Caminhada", diz Sousa.

Para o advogado Valdecy Alves, um conterrâneo ativista social e poeta, apaixonado pela história do seu povo, no Açude Patu foi montado um dos sete campos de concentração do Ceará, precisamente no local onde foi montado o canteiro de obras para construção da barragem, inaugurada somente meio século depois, nos anos 80, e com tamanho bem menor.

"Por mais de 60 anos, as promessas de sua conclusão elegeram muitos políticos demagogos e enganadores. Por ironia, todos os casarões que hospedariam os milhares de operários seriam utilizados em 1932 para concentração de mais de 20 mil flagelados" destaca.

Alves revela que o imenso número de retirantes da seca de 1932 foi confinado como gado em matadouro, para o holocausto cearense, tendo o campo recebido o título de "Curral da fome". Por conta da enorme quantidade de mortos, pela cólera e fome, eram enterrados em valas.

As vítimas eram flagelados de um raio de 100Km de Senador Pompeu. Assim criaram o Cemitério da Barragem, tornando-se o símbolo material de um lugar santificado, cheio de tabu e centro de peregrinação, envolto em lendas e narrativas da memória popular", rememora.

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