Algo que poucos católicos sabem é que só
no século XX houve mais mártires que em todos os 19 séculos anteriores
somados. Na celebração do Jubileu do ano 2000, o Papa João Paulo II
disse:
“Estes dois mil anos depois do
nascimento de Jesus Cristo estão marcados pelo persistente testemunho
dos mártires. Também este século, que caminha para o seu ocaso, conheceu
numerosíssimos mártires, sobretudo por causa do nazismo, do comunismo e
das lutas raciais ou tribais. Sofreram pela sua fé pessoas das diversas
condições sociais, pagando com o sangue a sua adesão a Cristo e à
Igreja ou enfrentando corajosamente infindáveis anos de prisão e de
privações de todo gênero, para não cederem a uma ideologia que se
transformou num regime de cruel ditadura. Do ponto de vista
psicológico, o martírio é a prova mais eloquente da verdade da fé, que
consegue dar um rosto humano inclusive à morte mais violenta e
manifestar a sua beleza mesmo nas perseguições mais atrozes.
Inundados pela graça no próximo ano
jubilar, poderemos mais vigorosamente erguer ao Pai o nosso hino de
gratidão, cantando: Te martyrum candidatus laudat exercitus (o exército
resplandecente dos mártires canta os vossos louvores). Sim, é o
exército daqueles que “lavaram as suas vestes e as branquearam no sangue
do Cordeiro” (Ap 7, 14). Por isso, a Igreja espalhada por toda a terra
deverá permanecer ancorada ao seu testemunho e defender zelosamente a
sua memória. Possa o povo de Deus, revigorado na fé pelos exemplos
destes autênticos campeões de diversa idade, língua e nação, cruzar
confiadamente o limiar do terceiro milênio. À admiração pelo seu
martírio associe-se, no coração dos fiéis, o desejo de poderem, com a
graça de Deus, seguir o seu exemplo, caso o exijam as circunstâncias”
(Bula Incarnationis Mysterium nº 13).
O Papa João Paulo II nomeou uma Comissão destinada a
recensear e conservar a memória dos mártires do século XX. A tal
Comissão foi confiada uma tríplice tarefa:
- Elaborar um catálogo dos mártires do século XX;
- Preparar a comemoração desses mártires (marcada para 07/05/2000);
- Aprofundar a contribuição espiritual que trouxeram à Igreja.
Já existem mais de dez mil relatos de
martírio ocorrido nos diversos continentes chegaram a Roma, alguns
redigidos em duas linhas, outros em centenas de páginas; chegaram em
cerca de dez línguas diferentes, que é preciso traduzir para o italiano e
passar para o computador num programa especial de informática. Quanto à
procedência desses relatos, 45% vêm de Conferências Episcopais e 40% de
Congregações ou Ordens Religiosas.
Coloca-se uma questão nova a propósito
do conceito de mártir: será mártir somente quem morre por ódio à fé ou
pode ser tido como mártir aquele que passou anos em cárcere ou em campo
de concentração, tendo sofrido cruéis tormentos, mas foi posto em
liberdade ainda vivo? Houve, na realidade, Bispos, como Monsenhor
Velychkovskyj na Ucrânia e Monsenhor Fishta na Albânia, que foram
libertados da prisão quando estavam gravemente enfermos por causa das
torturas e dos maus tratos e morreram pouco depois; podem ser
equiparados aos mártires no sentido clássico?
As respostas enviadas aos questionários
emitidos pela Comissão foram assaz diversas. Em setembro de 1998, a
Igreja da Espanha tinha mandado 2075 relatórios; a da França, dez.
Depois, a França enviou mais cinquenta relatórios e a Espanha mais 2000
novos relatórios; a Coreia, 200; a Polônia, 900. Quanto aos países
dominados por governo anticatólico (Vietnam, China, Sudão…), têm-se
manifestado timidamente – o que bem se entende, dado o controle das
autoridades civis.
É de notar ainda que em Jerusalém existe
o Instituto Yad-Vashem, fundado em 1953 para recensear os nomes de
pessoas não israelitas que ajudaram ou salvaram judeus perseguidos, com
risco para a sua própria vida; esses beneméritos recebem o título de
“Justos das Nações”, que “amaram o próximo como a si mesmos”. Na Europa,
12.000 justos foram assim reconhecidos e muitos ainda ficam no
anonimato. A justificativa apresentada para a exaltação desses nomes é
que “todo aquele que salva uma vida salva o universo todo inteiro”.
Prof. Felipe Aquino
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