O texto abaixo foi extraído de um site Português, um ótimo texto.
Aos Rev.dos Presbíteros e Diáconos
Aos Religiosos e Religiosas e demais Consagrados
Aos fiéis leigos, adultos e jovens, da Igreja do Algarve
Introdução
Na sequência das celebrações pascais, tão
ricas de significado teológico e litúrgico, apraz-me trazer à vossa
consideração alguns pontos de reflexão pastoral, com aplicação prática
já no próximo mês de Maio, devocionalmente dedicado a Maria pelos
nossos cristãos, junto dos quais adquiriu foros de tradição secular.
No dizer de João Paulo II, a “piedade popular
não pode ser ignorada nem tratada com indiferença ou desprezo, porque é
rica de valores e já, de per si, exprime a atitude religiosa perante
Deus” (Vicesimus quintus annus: 4/12/1988, 18). A “história mostra que
a relação entre a Liturgia e a piedade popular se deteriora quando
nos fiéis se atenua a consciência de alguns valores essenciais da
Liturgia” (Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos
Sacramentos, Directório sobre piedade popular e a Liturgia, 48). Mas
também é certo que “a Liturgia e os exercícios de piedade devem
coexistir, no respeito pela hierarquia de valores e pela natureza
específica de cada uma destas expressões culturais” (Paulo VI,
Marialis cultus (MC), 31 e 38).
É, pois, com muita alegria e esperança que,
após as nossas celebrações pascais, ápice da vida litúrgica da Igreja,
me dirijo a todos vós, com a certeza do precioso contributo espiritual
que todos poderemos obter da celebração do mês de Maio, vivido, com
amor e devoção filial, em honra de Maria.
1 – O mês de Maio no tempo pascal
Importa ter em consideração que o tempo pascal
está centrado, de modo particular, nos mistérios do Senhor
ressuscitado, e, liturgicamente, está organizado em função da
mistagogia, própria do processo catecumenal da Iniciação cristã. Nada
impede porém, de se harmonizarem as coisas de tal forma que a devoção a
Nossa Senhora não só saia fortificada, como até possa contribuir para
um melhor aproveitamento do espírito desta quadra litúrgica. Maria
não é concorrente de seu Filho e anda profundamente ligada ao mistério
da Páscoa e do Pentecostes. Além disso, é muito bom que os neófitos e
os fiéis se dêem conta da função de Maria, glorificada junto de Deus,
a desempenhar um amoroso papel de Mãe, aqui e agora, na terra, por
ocasião da própria celebração dos sacramentos da Iniciação.
2 – O mês de Maio e a devoção mariana
O mês de Maio, entre nós, portugueses, é
popularmente conhecido, no ambiente cristão, como o «mês de Maria». Esta
prática devocional remonta ao século XVI, mas é, sobretudo, a partir
do século XVIII que ela mais se desenvolve. Trata-se de uma devoção
mariana, sem grande relação, em si mesma, com a Liturgia dos mistérios
cristãos, desenvolvida no mundo ocidental. Na prática cristã
oriental, também existem meses marianos, mas mais enquadrados na
própria Liturgia. Recordemos, a título de exemplo, o mês de Agosto, no
rito bizantino, todo ele à volta da solenidade da Assunção de Maria;
recordemos ainda o «mês mariano» do rito copta, que abrange todo o
período natalício.
Não importa, neste contexto, fazer grandes
digressões sobre esta matéria. Temos um mês, dedicado, popularmente, a
Maria. Importa valorizá-lo como prática devocional, enriquecendo-o
com elementos bíblicos e litúrgicos e enquadrando-o no tempo pascal em
que ele se situa.
3 – O mês de Maio e a devoção do Rosário
Na devoção a Nossa Senhora praticada durante o
Mês de Maria, teve sempre grande incremento, entre nós, a recitação do
Terço. Mas, depois das Aparições da Virgem do Rosário, em Fátima, esta
devoção, que já era praticada nas comunidades paroquiais e,
sobretudo, nas famílias, recebeu um grande incremento na prática
devocional das nossas gentes. Infelizmente, nos últimos tempos, tem
andado muito esquecida e foi abandonada, no todo, ou em parte, por
muitos cristãos, famílias e comunidades.
O Papa João Paulo II, em Outubro passado, veio
dar um novo impulso a esta prática de devoção mariana, ao instituir o
Ano do Rosário e ao fornecer-nos preciosos elementos para a sua
valorização bíblica, teológica, espiritual, comunitária e familiar.
Por tudo isto, entendi dever dizer uma palavra,
aos cristãos da Diocese do Algarve, no sentido não só de estimular a
recitação do Terço, mas também de dar um impulso à celebração
comunitária e familiar desta devoção, como forma privilegiada de
responder, ao nível da nossa Igreja diocesana, aos apelos do Sumo
Pontífice, no âmbito do Ano do Rosário.
4 – A importância do Rosário
Nos dias que correm, há quem faça acusações à
forma de rezar, contida no Rosário, apelidando-a de árida, monótona e
aborrecida. O Santo Padre responde a esta objecção, dizendo: “chega-se
a uma ideia muito diferente, quando se considera (esta forma de
rezar) como expressão daquele amor que não se cansa de voltar à pessoa
amada com efusões que, apesar de semelhantes na sua manifestação, são
sempre novas pelo sentimento que as permeia” (João Paulo II, Rosarium
Virginis Mariae, (RVM) 26). É que, «para compreender o Rosário, é
preciso entrar na dinâmica psicológica, típica do amor» (Ib.).
O Rosário é uma forma de oração simples, mas
de profundo sentido contemplativo. Escreveu o Papa, na sua Mensagem
aos jovens, para o XVIII dia mundial da Juventude: “Recitar o Rosário
significa aprender a contemplar Cristo, com os olhos da sua Mãe, amar
Jesus com o coração da sua Mãe”. Já o dizia, por outras palavras, o
Directório sobre a piedade popular e a Liturgia, em Dezembro de 2001: O
Rosário é uma “oração de marca bíblica, centrada na contemplação dos
eventos salvíficos da vida de Cristo, a quem a Virgem Maria esteve
intimamente associada” (n. 197). Importa, pois, restituir a oração do
Rosário à sua primigénia inspiração de «oração tipicamente
meditativa», que a faça converter numa forma privilegiada de «oração
do coração».
“Recitar o Rosário nada mais é senão contemplar,
com Maria, o rosto de Cristo” (RVM 3). O Papa lembra-nos algumas das
características desse olhar contemplativo de Maria sobre Jesus: no
templo, o seu olhar é de interrogação; em Caná, é um olhar de
penetração no coração do Filho e nas necessidades humanas; no
Calvário, é um olhar de dor; na Ressurreição, é um olhar de júbilo; no
Pentecostes, é um olhar de ardoroso zelo apostólico. Mas, ao mesmo
tempo que, pela contemplação dos mistérios se vai penetrando, com o
olhar da fé, nestes, e noutros que o Rosário nos proporciona
contemplar, esta forma de rezar, meditando, faz-nos reviver, com
Maria, a presença de Cristo. E Maria, ao recordar os mistérios de seu
Filho, revia-os pela memória, fixava-os, configurava-se a eles,
dirigia-se ao Filho em súplica, e partia para a vida, anunciando-O. O
Rosário é, de facto, uma oração cristológica. Nele, “sobre o fundo das
palavras da ‘Ave Maria’, passam diante dos olhos da alma, os
principais episódios da vida de Jesus Cristo” (RVM 2). O Rosário, sem
esta contemplação dos mistérios de Cristo, é «um corpo sem alma», como
disse Paulo VI, na Marialis cultus (47).
5 – A oração do Rosário, no mês de Maio
A oração do Rosário não é prescrita aos
cristãos, sob a forma de preceito. É devoção e é como devoção que deve
ser praticada. Mas é uma excelente oração, da qual, de modo livre,
nenhum cristão deveria dispensar-se. A gratuidade desta forma de rezar
deveria induzir-nos a praticar esta devoção com toda a tranquilidade
de espírito, atraídos apenas “pela sua beleza intrínseca” (MC 55). É
bom, é mesmo muito bom, rezar em sintonia com as recordações de Maria e
com o olhar da Mãe do Senhor.
Como oração devocional, o Rosário pode ser
rezado a sós, em família, em grupos, em movimentos associativos, em
pequenas comunidades, de forma comunitária (nas paróquias). Neste mês
de Maio, recomendo vivamente aos Pastores que fomentem a sua recitação
a todos estes níveis, e exorto-os à criatividade de formas, e ao
aproveitamento das mais variadas oportunidades existentes na vida das
nossas comunidades paroquiais.
5.1 - Nas paróquias
Fomente-se a recitação diária do Terço, em todas
as paróquias, durante o mês de Maio. Constituam-se grupos de fiéis
que garantam, em cada dia, essa oração, à qual possam associar-se
todos quantos queiram.
Sejam os fiéis ajudados, no sentido de entrar no
espírito contemplativo dos mistérios, quer através de subsídios, quer
por meio de leituras bíblicas, quer por introduções preparadas para o
efeito.
Ao menos uma vez por semana, em dia e hora
estabelecidos com antecedência, presida o próprio Pároco à sua
recitação, valorizando-a, ao máximo. Para o efeito, tenha em conta todos
os elementos apresentados pelo Papa na Rosarium Virginis Mariae,
sobretudo: o sentido cristológico dos mistérios; a contemplação dos
mesmos; a recitação da ‘Ave Maria’ como louvor, à Virgem, pelo fruto
do seu ventre, a que poderá acrescentar-se uma «cláusula» apropriada,
de carácter cristológico; a valorização do Pai nosso; a introdução
duma colecta, no final de cada dezena.
Como intenções comuns a toda a Diocese, tenha-se
presente a regeneração das famílias, a paz no mundo e as vocações ao
sacerdócio e à vida de consagração.
“Uma oração tão fácil e ao mesmo tempo tão rica
merece verdadeiramente ser descoberta de novo pela comunidade cristã”
(RVM 43).
5.2 – Nas famílias
Na sua Carta apostólica, sobre o Rosário, o
Papa coloca-o no interior das nossas preocupações pastorais com as
famílias, e diz: “O relançamento do Rosário nas famílias cristãs, no
âmbito de uma pastoral mais ampla da família, propõe-se como ajuda
eficaz para conter os efeitos devastantes desta crise da nossa época”
(RVM 6). E acrescenta: “Outrora, esta oração era particularmente amada
pelas famílias cristãs e favorecia certamente a sua união. É preciso
não deixar perder esta preciosa herança. Importa voltar a rezar em
família e pelas famílias, servindo-se ainda desta forma de oração” (Ib.
41). Hoje os membros das famílias não conseguem encontrar-se, “e os
raros momentos para isso acabam infelizmente absorvidos pelas imagens
duma televisão. Retomar a recitação do Rosário em família significa
inserir na vida diária imagens bem diferentes – as do mistério que
salva” (Ib.). Assim sendo, exorto, vivamente, todos os casais
católicos a experimentarem, durante este mês de Maio, fazer uma pausa
para a oração em família. Onde, e quando for possível, recite-se o
Terço do Rosário; se isso for impossível, não deixem as famílias de
rezar, pelo menos, uma Dezena do terço, em conjunto, pelas grandes
intenções acima apontadas.
Recomendo aos Párocos que fomentem isto mesmo,
junto das famílias das suas paróquias, por meio de apelos diversos,
nas reuniões da comunidade; por meio de pagelas e outros meios, a
distribuir, servindo-se, para o efeito do contributo dos núcleos da
Legião de Maria, Rosaristas e Mensageiros de Fátima, ou outros membros
das suas comunidades.
5.3 - Nos grupos de jovens
Na Mensagem papal para o dia mundial da
juventude, do ano em curso, acima citada, o Sumo Pontífice dirige-se
assim aos jovens: “Não tenhais vergonha de recitar o Rosário sozinhos,
ao irdes para a escola, a universidade ou o trabalho, ao longo do
caminho e nos meios de transporte público. Habituai-vos a recitá-lo
entre vós, nos vossos grupos, movimentos e associações” (5). Não
seriam precisas mais palavras. Oxalá os jovens tomem a peito este apelo
do Papa.
Mas, não me escuso de fazer a minha recomendação
aos jovens do Algarve, como exortação episcopal para todos os jovens
cristãos desta Diocese. Aos grupos de jovens, paroquiais e outros,
integrados em movimentos e associações de cariz cristão, peço que se
interessem vivamente por esta causa. Ponde a vossa imaginação a
trabalhar, e não deixeis passar este mês de Maria sem terdes para com
Ela algum gesto de muita ternura e afecto filiais. Sei que sois muito
sensíveis ao valor da paz. Rezai, a sós, e em grupo, ao «Príncipe da
paz» - o Filho de Maria, por intercessão de sua Mãe. Sei que sois
sensíveis ao amor e aos valores familiares. Não deixeis de recomendar à
Mãe de Jesus, as vossas próprias famílias. Sei que sois generosos e
capazes de total entrega aos grandes ideais, não deixeis passar este
mês de intensa oração, em favor das vocações sacerdotais, religiosas e
missionárias, sem esquecerdes as consagrações laicais e a vocação à
família.
Caros jovens, convido-vos, tal como o Papa, a
rezar o terço, a sós ou em grupo. Associai-vos à sua recitação na
paróquia, na vossa família, nos vossos grupos. Estimulai os vossos
pais a fazê-lo. Se quereis bem a Cristo, contemplai-O; se amais a sua
Mãe, que também é vossa, uni-vos a Ela, na contemplação de Jesus. Que
Deus vos abençoe. Que a Virgem Maria se sinta bem convosco, neste
lindo mês a Ela dedicado.
† Manuel Madureira Dias
Bispo do Algarve
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