segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Degradação Enquanto parques agonizam, reformas ficam apenas no papel

Reformas foram prometidas, mas nunca executadas. Com isso, parques se encontram abandonados
Pouco a pouco, vitimados pelos maus tratos do tempo e do homem, e pelo descaso do poder público, os parques ecológicos de Fortaleza vão definhando. Em uma cidade onde as áreas verdes ocupam menos de um terço do território, os logradouros deveriam ser templos de recursos naturais intocáveis, mas, nos últimos anos, sua preservação tem sido comprometida e protelada com base em promessas e projetos de revitalização que nunca saíram do papel.

O Parque Parreão, no Vila União, acumula desgastes que vão desde o pavimento danificado e a falta de manutenção de pontes e do "playground", ao mau cheiro causado pelo canal que perpassa o logradouro. Em 2011, a Secretaria Regional (SER IV) afirmou que o projeto de reforma do local já estava em elaboração, com consertos do piso, dos bancos e da iluminação pública. Os reparos, no entanto, nunca chegaram à praça FOTOS: NATINHO RODRIGUES

Localizado no bairro Vila União, o Parque do Parreão de hoje não se assemelha em nada ao que Alexandre Barbosa conheceu quando assumiu a função de vigia do local, há 12 anos. "Quando cheguei aqui, era muito bonito, cheio de plantas, as pessoas gostavam de passear. Mas tudo foi se acabando", diz.

De fato, quase tudo se acabou. O espaço verde perdeu a vivacidade, enquanto a infraestrutura do logradouro sofreu degradações. As pedras do calçamento foram arrancadas, os bancos quebrados e até as pontes construídas na criação do parque já não existem mais. Restou aos funcionários improvisar tábuas de madeira para fazer, de forma arriscada, o trajeto.

No início de 2011, a Secretaria Regional (SER IV), responsável pela manutenção do lugar, garantiu que um projeto de urbanização estava sendo elaborado, no qual eram previstos reparos gerais e melhorias na iluminação pública. Mais de dois anos depois, nada foi feito.

Cuidado
No Parque Adahil Barreto, situado no Dionísio Torres, a negligência é a mesma. Pelas calçadas e vias não se veem frequentadores, afastados devido ao precário estado de conservação em que se encontra o logradouro. A ferrugem tomou conta dos brinquedos outrora utilizados por crianças. Sem manutenção, o lugar acabou virando refúgio de gatos desabrigados. Agora, nem as árvores que ainda sobrevivem em meio à penúria servem para atrair visitantes.

Além de apresentar com pichações, o Parque Rio Branco não é regulamentado por lei como área verde, favorecendo desmatamentos
O parque é outro exemplo de projetos que não foram executados. Em julho do ano passado, conforme os órgãos municipais encarregados da administração, a reforma do espaço já se encontrava em planejamento e, inclusive, possuía licitação, mas o restauro nunca chegou ao local.

No caso do Parque Rio Branco, o problema vai além da revitalização. O logradouro, instalado em 1976, até hoje não foi regularizado como área verde, proposta que se arrasta desde 1992 e se transformou em abaixo-assinado neste ano. Sob coordenação do Movimento Pró-Parque, a petição foi desenvolvida no intuito de pressionar a Prefeitura Municipal a proteger a reserva por decreto e, assim, impedir o processo de degradação da vegetação do lugar e do Riacho Rio Branco, cuja nascente está localizada no terreno.

"O descuido do Parque é um fato. Estavam ocorrendo derrubadas de árvores na frente do riacho e ninguém sabia quem eram os responsáveis, o que mostra o despreparo da administração para lidar com essa área de preservação", diz Ademir Costa, coordenador do Pró-Parque.

Espaço
O uso irregular também ameaça o Parque Rachel de Queiroz, reserva ambiental espalhada pelos bairros Ellery, Presidente Kennedy e Pici. O parque, na verdade, não existe. Isso porque a própria implantação legal do espaço está, há mais de dez anos, em aberto. Segundo Aguinaldo Aguiar, coordenador do Movimento Pró-Parque Rachel de Queiroz, o projeto do logradouro foi concebido após denúncias de invasões da área verde por empresas e construtoras, o que, por conta da ausência de regulamentações, continua ocorrendo sem controle.

A região do Parque Rachel de Queiroz, cuja implantação é prometida há mais de 10 anos, tem sido ocupada por empreendimentos

"As áreas verdes estão caçadas, principalmente por causa da especulação imobiliária. Aqui, como o parque não é delimitado, a qualquer minuto pode surgir um novo prédio", destaca Aguiar.

Conforme ele, as promessas tiveram início em 2011, quando a criação do primeiro trecho do parque, que inclui 15 ao todo, começou a ser licitada pela então administração municipal. No entanto, o processo não foi adiante. Desde então, o coordenador afirma que a ocupação só cresce, prejudicando o que restou da vegetação e dos mananciais que fazem parte do território. "A preservação do parque é importante não só para a região, mas para toda a cidade", frisa.

Nenhum dos órgãos encarregados das revitalizações dos parques explicou as razões pelas quais os projetos de reformas e regulamentações não foram efetivados. Contudo, as gestões fizeram novas promessas de providências em relação à manutenção dos logradouros.

Expectativas
Airton Mourão, titular da Secretaria Regional IV (SER IV), responsável pelo Parreão, afirma que o projeto desenvolvido em 2012 foi atualizado e será posto em prática ainda nesse ano. Segundo ele, o órgão encaminhará o plano à Comissão de Licitações da Prefeitura nesta semana. Após a autorização, a reforma completa do logradouro deve durar cerca de 180 dias.

O Parque Adahil Barreto, um cenário do descaso, virou abrigo para dezenas de animais. O local não passa por reformas desde 2005

Em relação ao Parque Adahil Barreto, a SER II declarou, por meio da assessoria de comunicação, que um novo projeto de revitalização está sendo desenvolvido e a previsão é que seja iniciado até março de 2014. Sobre o Parque Rio Branco, a Secretaria de Meio Ambiente e Urbanismo (Seuma) alegou que irá elaborar estudos técnicos visando à proteção do local e fortalecer a fiscalização para prevenir desmatamentos ilegais. Sobre a regulamentação, no entanto, nada foi afirmado.

A reportagem procurou a assessoria de comunicação da Secretaria Regional III para saber sobre a construção do Parque Rachel de Queiroz, mas não obteve resposta até o fechamento desta edição.

OPINIÃO DO ESPECIALISTA
Capital deve incorporar o verde

Andrea AgdaArquiteta urbanista

O bem-estar na cidade cresce à medida que há integração entre a paisagem urbana e a natureza. Ser e estar em uma cidade, caminhar pelas ruas e parques, sentir a sombra das árvores, isso tudo é garantido ao cidadão. De acordo com o Estatuto das Cidades, temos direito a cidades sustentáveis.

Em Fortaleza, apesar da ajuda da natureza, a paisagem não se desenha de forma favorável a tal experiência. Somos privilegiados, temos um clima muito bom, o que nos falta é sombra, vegetação abundante e, principalmente, um Projeto de Cidade. Temos extensa faixa de praia com muitos trechos privatizados ou desertificados, e os rios e as lagoas deixaram de ser espaços potenciais de convívio, lazer e contemplação, para se restringirem às funções de drenagem e despejo irregular de resíduos.

Mesmo com a regulamentação de algumas áreas de preservação, a cidade não apresenta um plano integrado que incorpore de forma harmônica as regiões verdes ao seu tecido urbano. Devemos investir nosso esforço para organizar, manter e ampliar essas áreas. Temos rios, lagoas, praias, mangues. As estruturas ambientais estão aí. Só não vê quem não quer.

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