Dom Redovino Rizzardo, cs
Bispo de Dourados
Bispo de Dourados
Dentre os primeiros santos canonizados pelo Papa Francisco no dia 12 de maio de 2013, estavam 800 italianos, assassinados por ódio à fé no dia 13 de agosto de 1480, na cidade de Otranto, por otomanos turcos, que invadiram a região e os obrigaram a escolher entre morrer ou abraçar a religião muçulmana.
“Matar em nome de Deus” é o absurdo a que podem chegar as religiões. Alicerçadas na “certeza” de possuírem a verdade, julgam-se no direito e no dever de eliminar a quem ousa divergir. Antigamente, talvez fosse possível que o fizessem de reta intenção, se o próprio Jesus chegou a dizer: «Chegará o dia em que, quem vos matar, julgará estar prestando culto a Deus. Mas, quem assim age, o faz porque não conhece o Pai nem a mim» (Jo 16,2-3). “Antigamente”, porque continuar a fazê-lo hoje é um atestado de ignorância que se dá à humanidade. Infelizmente, é o que acontece em vários países, dominados por religiões arcaicas ou por ideologias radicais.
Durante vários séculos, a própria Igreja Católica pagou tributo a esse pecado. A Inquisição, as Cruzadas, a Noite de São Bartolomeu (1572), a Guerra dos 30 Anos (1618/1648) e inúmeros outros fatos alertam para as nefastas consequências trazidas pelo conchavo entre a religião e o poder político e econômico. Contudo, ao mesmo tempo, é preciso precaver-se contra as meias verdades propaladas por pessoas cujo intento é denegrir a Igreja. Foi o que reconheceram, em relação à Inquisição, os próprios autores da “Enciclopédia” (1751/1772), a obra filosófica que preparou a Revolução Francesa: «Sem dúvida, imputaram-se a um tribunal, tão justamente detestado, excessos de horrores que nem sempre ele cometeu. Não é correto erguer-se contra a Inquisição por fatos duvidosos e, pior ainda, buscar na mentira meios para torná-la odiosa».
Escrevi acima que antigamente, talvez, tudo isso fosse perdoável, porque os tempos eram outros. Graças a Deus, a partir sobretudo do Concílio Vaticano II (1962/1965), a Igreja Católica mudou sua relação com o mundo. Mas parece que o seu lugar e o seu jeito de agir foram ocupados por seus críticos. É o que provam as perseguições que ela vem sofrendo nestes últimos cem anos.
Na Rússia, em 1914, os católicos eram 5.000.000, assistidos por 27 bispos e 2194 sacerdotes. Em 1917, logo após a tomada do poder pelos comunistas, eles diminuíram para 2.500.000, os bispos para 14 e os padres para 1350. Em 1941, das 600 igrejas que funcionavam em 1917, apenas duas continuavam abertas. Havia somente um bispo (porque estrangeiro) e 20 padres. Em apenas dois anos (de 1937 a 1939), foram fuzilados 150 sacerdotes.
O México, apesar de contar com uma população predominantemente católica, foi palco de uma violenta ação antirreligiosa desencadeada pelo governo hostil à Igreja. Os conflitos iniciaram com a promulgação da Constituição de 1917 e alcançaram seu ápice na “Guerra Cristera” (1926/1929). As hostilidades custaram a vida de quase 90.000 pessoas, de ambos os lados. Uma multidão de católicos – dentre eles, mais de 50 padres – foram assassinados por seu apego à fé.
Em sua obra “Para entender a Inquisição”, Felipe Aquino cita a Espanha como outro país em que a Igreja pagou caro por sua fidelidade ao Evangelho: «Na Guerra Civil Espanhola (1936/1939), as grandes vítimas foram os católicos. O ódio à Igreja e aos fiéis cresceu tanto, que morreram assassinados 12 bispos, 4000 sacerdotes e 2300 religiosos, além de milhares de leigos. Só na cidade de Madri foram mortos 334 padres diocesanos; muitos foram queimados ou enterrados vivos».
Há 1700 anos – em fevereiro de 313 –, através do “Edito de Milão”, o imperador Constantino concedeu aos cristãos a liberdade de culto. Contudo, a perseguição sempre os acompanhou. Em dois mil anos de história, milhões deles foram – e continuam sendo – marginalizados e massacrados. 75% das vítimas atuais do ódio antirreligioso no mundo são católicos, evangélicos e ortodoxos. O “É proibido ser cristão” dos romanos vigora ainda hoje não apenas em alguns países comunistas e muçulmanos, mas, sobretudo, em ambientes sociais que passam por evoluídos, onde a fidelidade ao Evangelho se paga com a perda da reputação, do emprego e, não poucas vezes, da vida. Não foi por nada que Jesus advertiu: «O Reino dos céus sofre violência, e só os corajosos o conquistam!» (Mt 11,12).
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